Monday, August 9, 2010

De composições - PARTE II

Depois de meses, graças a insistência dos meus companheiros de banda, volto aqui nesse espaço para concluir a minha saga sobre a trajetória de um compositor. Mas... Onde é que eu tinha parado mesmo? Ah, quando você consegue formar uma banda, a despeito de todas as intempéries que desde cedo o mundo cão colocou no seu iluminado caminho de artista.
Pois é, você e a sua galera tem uma banda. Um de vocês conseguiu o pequeno milagre que foi convencer o pai a comprar uma guitarra e um amplificador, e outro de vocês conseguiu o GRANDE milagre que foi convencer o síndico do prédio que ter uma bateria no quarto ia pelo menos afugentar os ratos do encanamento. E agora, devemos supor que você vai seguir facilmente o trajeto sarau da escola- maracanazinho-carniege hall sem mais problemas? Hahaha, não me faça rir. Seus problemas estão apenas começando.
Fora todas as dificuldades inerentes a uma banda iniciante formada por adolescentes (preciso citar aqui a má vontade dos donos de estúdio, a má vontade dos pais e mães, a má vontade dos vizinhos, a má votnade dos amigos em ouvir suas coisas, a má vontade de Deus a respeito da sua existência, etc?) você ainda tem que arcar com o problema sério de ser o COMPOSITOR da banda. Sim, por que mesmo que vocÊs façam um ou outro cover, sei lá, do kings of leon, o que vocÊ quer mesmo é expressar a sua sensibilidade-criativa-pluri-semiótica, ou em outras palavras a sua dor de corno em relação àquela menina da primeira parte do texto. Então você, assim que toca a sua música pra galera, achando em questão de instantes vocês a estarão executando com a harmonia de anjos do senhor, é bombardeado pelas curiosíssimas perguntas:

-pô, como é que vai ser a linha de baixo?
-ih, esse acorde aí eu não sei fazer não...
-Não dá pra encaixar esse solo maneirão que eu fiz?
-Que que a bateria faz agora?
-Por que que ao invés dessa a gente não toca aquela outra do Kings of Leon?

Tudo bem, tudo bem, engula esse sapo, jovem compositor, por que isso acontece mesmo. Só não engula aquela primeira pergunta, feita pelo baixista, por que nunca se deve dar muita confiança a essa gentinha. Ao baixista vocÊ responde assim:

-Toca qualquer merda, ninguém vai ouvir mesmo.

Se depois de alguns meses esses problemas continuarem não se resolvendo, não desanime. Isso só quer dizer que vocês vão ter que ser muito bonitos pra banda dar certo. Agora, caso você e sua banda tenham conseguido superar essa primeira fase dificil, é hora de se animar! Isso significa que agora vocÊs vão fazer um show! Pode ser no play do prédio, no sarau da escola ou no quintal-da-casa-do-baterista-situada-numa-cidade-satélite-à-sua-escolha, como foi o caso do Pangaré Valente. Finalmente o mundo conhecerá as suas composições, principalmente se vocÊ entender "mundo" como os vinte gatos pingados que forem nesse show.
Vocês se acertaram. Definiram as harmonias, controlaram o impulso de solar o tempo inteiro do guitarrista, ajeitaram o tempo das músicas... Na solidão do seu lar, você deu vazão ao seu lirismo e compôs letras que invejariam um chico buarque. Bom... talvez não tanto, mas pelo menos letras que invejariam, sei lá, o Frejat, o que já é um começo. Chegou o grande dia!
É claro que essa é a hora em que você descobre, como qualquer um que um dia já tenha feito ou assistido um desses "shows de bandinha", que não adianda PORRA NENHUMA ensaiar direito pra esses shows, por que invariavelmente a mesa de som e a acústica do lugar vão estar disputando pra ver qual consegue se mais abaixo da crítica, o som vai ser um bololõ só e ninguem vai conseguir ouvir nada direito. Muito menos aquela mesóclise genial que vocÊ botou na segunda estrofe da sua música de harmonia hiper-elaborada. Com sorte as pessoas vão entender quando vocÊs começarem a tocar Kings Of Leon e você então vai cair nas grças de alguma menininha da platéia e sair do palco bem acompanhado. Com azar isso não vai acontecer, mas daí é bom também, por que bons companheiros de banda + show ruim é a receita perfeita para um delicioso porre.

Aqui encerro o meu relato. Mas como assim, então nada mais acontece na vida de um compositor? Não, mané, não é isso. Mas é que agora vocÊ tem dois caminhos. Ou você persevera, é gravado por uma voz modernosa e feminina da mpb e daí é elevado ao status de "agitador cultural", ou você vai ficar repetindo a história que eu contei aqui ad infinitum. Nenhuma das duas hipóteses me parece render muitas piadas, e afinal esse texto é só um pretexto para elas. Mas ok, se um dia eu for gravado por uma jovem cantora revelação da emepebê, eu juro que eu volto aqui e escrevo um outro texto contando.

obrigado pela atenção, e ouçam nosso som!

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